O k-pop, como outras esferas da indústria do entretenimento, busca a perfeição de seus idols, desde o rigoroso sistema de treinamento até o momento após seu debut, com a expectativa de corresponder às altas demandas dos fãs. No entanto, essa incessante busca pela perfeição resulta na exclusão daqueles que não se encaixam nos padrões estabelecidos pelo pela cultura sul-coreana, incluindo pessoas com deficiência.

Em contraposição a esse cenário, a PARASTAR Entertainment desafia esse padrão convencional de perfeição, abrindo portas para a entrada de pessoas com deficiência na indústria do entretenimento. Através de iniciativas nas áreas de dança e atuação, por exemplo, a empresa promove a inclusão, destacando que a deficiência não é uma imperfeição, mas sim uma característica forte. Um exemplo dessa iniciativa é o Big O!cean, um projeto que promete transformar o atual cenário do k-pop. 

O trio, que realizou seu debut no último sábado (20), Dia Nacional das Pessoas com Deficiência na Coreia do Sul, é composto por Lee Chan Yeon (main rapper), Park Hyun Jin (main vocal) e Kim Ji Seok (main dancer), e tem como objetivo criar um novo gênero musical na indústria coreana, o “s-pop” – pop de língua de sinais, em tradução livre.  Nesse estilo, eles pretendem cantar utilizando a Língua de Sinais Coreana (KSL), a Língua de Sinais Americana (ASL) e a Língua de Sinais Internacionais (ISL). 

Da esquerda para a direita, Lee Chan Yeon, Kim Ji Seok e Park Hyun Jin. Foto: YONHAP NEWS.

A Língua de Sinais Coreana foi oficialmente reconhecida como segunda língua oficial da Coreia do Sul em 2015. Desde o final do século XIX houve movimentos em busca de auxiliar deficientes auditivos, culminando na promulgação da “Lei Básica sobre a Língua Coreana de Sinais” em 2008, que garante oportunidades iguais para todos os cidadãos, como através do oferecimento de tradução e interpretação para deficientes auditivos, quando necessário.

Assim como no Brasil, onde a Língua de Sinais Brasileira (Libras) é reconhecida como segundo idioma oficial e cujo ensino é obrigatório para aqueles que pretendem seguir a área da educação, na Coreia do Sul também existem universidades que oferecem treinamento em Língua de Sinais Coreana, inclusive oferecendo aulas e mestrado completamente ministrados na mesma.  


O Big O!cean pretende utilizar essa língua em seus lançamentos, abrindo novas oportunidades de se comunicar e expressar para os seus fãs. Em uma entrevista durante o pré-debut, Kim Ji Seok expressou seu desejo de se comunicar com os fãs através da língua de sinais, demonstrando o compromisso do grupo com a inclusão e a acessibilidade:

[Depois de debutar] quero realizar um fanmeeting. Espero que haja fãs com quem eu consiga comunicar através da língua de sinais. Se eu conseguir ter um evento assim algum dia, seria muito especial se eu conseguisse me comunicar com os fãs utilizando língua de sinais.

Ji Seok para o Korea Now.

A escolha do nome “Big O!cean” espelha o desejo dos membros em alcançarem o sucesso na indústria musical, buscando expandir seu talento para o mundo todo, assim como um oceano. Hyun Jin também complementa pontuando que eles querem espalhar esperança e alegria para seus fãs, despertando o sentimento de paz e conforto que um oceano nos transmite. 

Na entrevista pré-debut concedida ao portal Korea Now, os membros do grupo compartilharam relatos pessoais sobre suas experiências com perda auditiva e os desafios enfrentados no sistema de treinamento para trainees. Park Hyun Jin, carinhosamente apelidado de Plankton, revelou que sua perda auditiva foi resultado de uma febre alta na infância, por volta dos três anos de idade. Ele também compartilhou sobre sua jornada cirúrgica para a implementação de um implante coclear, uma prótese eletrônica que auxilia os pacientes na melhoria da audição.

Lee Chan Yeon, o membro mais velho, mas portador de uma fofura encantadora, compartilhou sua trajetória pré-idol, revelando que antes de ingressar no mundo do entretenimento, trabalhava em um hospital e participou de um evento destinado a celebridades com deficiência auditiva, como Kim Li Hoo. Foi através dessa experiência que ele teve conhecimento da PARASTAR Entertainment e decidiu fazer uma audição para ingressar na empresa.

Por outro lado, o membro mais jovem, Kim Ji Seok, contou sua motivação para entrar na carreira musical após enfrentar dificuldades na obtenção de apoio para sua deficiência auditiva nos testes para um curso de atuação. Diante dessa adversidade, ele encontrou na PARASTAR uma oportunidade para perseguir seu sonho artístico, onde finalmente viu sua aspiração se tornar realidade.

Além de enfrentar desafios pessoais relacionados à perda auditiva, os membros também enfrentam dificuldades durante seu treinamento, especialmente em relação à sincronização. No entanto, a empresa busca soluções para resolver esse problema, utilizando principalmente de auxílio tecnológico, através de parcerias com empresas de tecnologia, como a SK Telecom, para desenvolver ferramentas que os ajudem a superar esses obstáculos:

Eu tenho certeza que os membros se sentem da mesma forma, mas nós temos diferentes níveis de audição, então é bem difícil nos sincronizar enquanto cantamos ou dançamos. Por conta disso, nós apenas ficamos escutando repetidamente ou sentindo a vibração através dos nossos celulares. Nós precisamos trabalhar muito para conseguir pegar o ritmo e tempo correto.

Ji Seok para o Korea Now.

O grupo mantém um canal ativo no YouTube, no qual compartilham covers musicais, incluindo uma versão da música “Candy”, na versão do NCT Dream. Além disso, seguindo os passos do grupo da SM Entertainment, o Big O!cean planeja lançar um remake de uma das emblemáticas músicas do H.O.T, um dos pioneiros da música pop coreana, marcando seu debut com a faixa Hope, interpretando-a em diversas línguas de sinais. 

Eu entendo você
Quero me tornar
Seu lugar para se apoiar
Quero tocá-lo agora
Com um pequeno brilho
Minhas ondas que o abraçarão
Como um grande oceano, vamos lá

Glow, Big O!cean.

Assim como as músicas do H.O.T, a intenção do Big O!cean é transmitir aos seus fãs um sentimento de esperança para superar os desafios enfrentados e celebrar a conquista sobre as dificuldades associadas à deficiência. Eles buscam mostrar que essa não deve ser encarada como uma falha, mas sim como uma característica que os torna únicos, e que deve ser acolhida dentro de uma indústria que deveria permitir o sonho de todos os seus consumidores, independente de suas diferenças.