Anteriormente, realizei um texto falando sobre como a produção musical e as coreografias de Michael Jackson influenciaram o K-pop como conhecemos atualmente. Por mais que essas duas sejam as principais, há outras maneiras que o rei do pop inspirou o pop sul-coreano, seja de forma indireta ou não. Por isso, vale a pena trazer mais curiosidades que normalmente ficam nos bastidores da indústria da música.

Sistema de treinamento de artistas

Não é surpresa para quem acompanha K-Pop que os artistas tenham que passar por audições, avaliações e treinamentos até finalmente se tornarem “Idols”. Esses artistas praticam em diversas áreas como canto, dança, atuação, rap, entre outros. Isso os torna profissionais completos que estão preparados para se aventurarem em diversas frentes da arte e do entretenimento. O que muita gente não sabe é que esse modelo de formação artística surgiu na MOTOWN, gravadora estadunidense mundialmente conhecida por agenciar artistas como The Temptations, Marvin Gaye, Lionel Richie e os Jackson 5. 

Conhecida por ser um grande expoente da música e cultura negra, a MOTOWN trouxe ao pop uma abordagem diferente, principalmente quando se trata de boy bands e girl bands. Ela moldou seus artistas para dançarem sincronizados e cantarem muito bem enquanto fazem isso, mas sem esquecer de cativar fãs com uma personalidade midiática que representa ideais de uma geração.

E isso é exatamente o que as empresas de K-pop fazem com seus artistas, desenvolvendo em seus contratados uma figura quase sobrenatural que representa a juventude por meio de suas músicas e atitudes. E isso cativa fãs e causa curiosidade, não é à toa que reality shows de formação de grupos fazem tanto sucesso, como é o caso das franquias da Mnet como os Produces, I-land e os “Planets”, por exemplo. Essas empresas aprenderam com a MOTOWN a manter seus artistas próximos do público, mas não ao ponto de os tornar pessoas comuns.

Grupo I.O.I que foi formado em 2016 no reality show “Produce 101” no qual muitas integrantes possuem carreiras bem sucedidas tanto na música quanto na atuação (Foto:reprodução)

Esse sistema merece um debate mais aprofundado, pois são muitas questões que estão em pauta, principalmente quando o quesito é a idade e maturidade dos Trainees que dedicam todas suas vidas para isso. O mesmo aconteceu com Michael, desde criança ele estava no show business e isso o moldou até o final de sua vida. Entretanto, não podemos negar que mesmo com todas suas polêmicas, esse treinamento foi essencial para a criação de sua imagem artística como a figura icônica que ele é até hoje.

Álbuns de K-pop

(Foto:reprodução)

No documentário “Thriller 40” fala um pouco do objetivo de Michael em transformar essa gravação no maior álbum de todos os tempos, não bastava ser um disco, teria que ser uma experiência completa, desde a primeira música à última, mesmo com diferentes gêneros musicais, tudo foi trabalhado para contar uma história maior. E isso foi alcançado com sucesso quando o rei do pop levou oito GRAMMYS para casa no ano de 1984, entre eles Álbum do ano, Melhor Produção musical por “Thriller” e Gravação do ano por “Beat It”.

Isso se tornou comum no K-Pop, visto que as faixas costumam ter influências de vários ritmos como R&B, o Rock e o HipHop coexistindo num mesmo álbum, o que deixa o ato de ouvir todas as músicas algo divertido para o fã. Além disso, tudo é mais que o CD no K-pop, os photocards e as sessões de fotos agregam a experiência de ouvir o álbum, fazendo cada fã ter um momento quase personalizado. Não é à toa que muitos amantes do gênero investem em coleções inteiras de seus artistas favoritos. 

Dessa forma, as sessões de fotos com o conceito mostrando diferentes lados de cada artista, os encartes com as letras, pôsteres e os photocards, tudo deixa aquele disco uma experiência única para quem o tem. Na minha cabeça, eu conseguiria imaginar o Michael fazendo algo parecido, quem aí ia querer colecionar os photocards dele?

Vídeos musicais (MVs)

Os vídeos clipes são parte importante de qualquer artista pop e isso tem grande influência de Michael Jackson. Antes dele não havia uma cultura de criar vídeos para músicas, de ter neles uma junção de história que faz parte de um contexto, cenários elaborados e de uma coreografia marcante. Além disso, foi só depois dele e do “Thriller” que artistas pretos e de outros nichos puderam passar a transmitir seus vídeos na programação da MTV, que tinha uma postura elitista e racista. 

Assim, nesse período, criou-se uma tradição de investir dinheiro em vídeos elaborados que inseriram aquela música num universo maior, trabalhando cada single como um produto único e precioso. “Billie Jean” e “Beat it” mostram esse poder de Michael de contar histórias com seus vídeos, já que aqueles minutos criam quase um curta cinematográfico. Porém, não há nada que supere o impacto do vídeo “Thriller” no mundo. O figurino, a atuação, os efeitos especiais, a ambientação, os bailarinos, tudo colabora para construir o imaginário icônico que esse clipe gerou nas pessoas. 

Além da influência na tv e na música, esse clipe foi o grande responsável por fazer o disco bater o recorde. E com certeza serviu de inspiração para os MVs de K-pop como conhecemos hoje em dia como “One Shot” do B.A.P de 2013 e “I Got a Boy” do Girls’ Generation. Quem disse que não se fazem mais vídeos musicais como antigamente?

Turnês

ATEEZ foi apenas um dos artistas de K-pop que passaram pelo Brasil em 2023 em suas turnês (foto:reprodução)

No ano de 2023, o Brasil teve contato com diversos artistas do gênero que realizaram concertos aqui em solo nacional. E tudo foi influências que as turnês mundiais de Michael Jackson tiveram, visto que elas são algumas das mais lucrativas de todos os tempos. Não é para menos, ele entregava um espetáculo temático. Muitos dançarinos, trocas de figurinos, pirotecnia, e isso pode ser visto ser atualmente sendo aplicado no pop no geral. Entretanto, acredito que depois de Michael, ninguém tenha levado esse conceito tão a sério quanto os artistas de K-pop.

Quem já teve oportunidade de ir a um concerto sabe a experiência que é estar lá vendo o conjunto da obra ao vivo, esses artistas se tornam figuras que parecem vir de outro planeta, é uma mistura de sentimentos que causam a euforia dos fãs. Eu mesma já fui em show de artistas pop ocidental e de artistas de pop sul-coreano e a diferença é gritante. É a diferença de um show comum e um espetáculo. 

Artistas de K-pop como marcas

Jung Kook do BTS e Jennie do Blackpink como embaixadores da Calvin Klein (foto: reprodução)

Jackson foi visionário ao se transformar em uma marca, assim como o rei do rock, Elvis Presley, ele sabia que sua figura pública era importante perante ao público, não à toa que ele realizou filmes musicais como a adaptação do livro “O maravilhoso mágico de Oz” de 1978 do autor L. Frank Baum, chamada “O Mágico Inesquecível” (1978) e a antologia musical  Moonwalker (1988). 

Além disso, ele criou parcerias importantes com marcas grandes como a Pepsi, com shows e propagandas para a marca. Assim, a partir dali, as marcas passaram a procurar artistas para representar seus produtos e ideologias. Isso é algo muito comum hoje em dia no K-pop , principalmente no universo da moda, visto que várias grifes famosas chamam os Idols para serem a cara de suas campanhas. Ademais,  muitos artistas atuam em K-dramas enquanto promovem com seus grupos, é uma maneira de divulgar se tornar a “cara” de seu trabalho musical e levá-lo para pessoas que talvez não iriam ter contato com ele anteriormente. A cantora solista IU é um dos principais exemplos de carreira bem sucedida tanto na música como na atuação.

Em 2022, IU participou do filme de sucesso “Broker- Uma nova chnace” ao lado do astro de “Parasita”, Song Kang Ho (foto:reprodução)

Portanto, é possível ver como um artista tão importante como Jackson foi capaz de inspirar tantos outros que somos fãs e admiramos. É essencial ver como ele abriu portas e inaugurou discussões socioculturais sobre a indústria do show business que são relevantes até hoje. No futuro, tenho certeza que terão ainda mais músicos de K-pop que trarão visuais e sonoridades icônicas que remetam a “blueprint” que foi o Thriller.