“Quem garante que amanhã você não vire um sem-teto?”. Essa frase está ecoando na minha mente desde o momento que terminei de assistir “Campeonato dos sonhos”, novo filme coreano da Netflix. O longa se passa em 2010 e conta a história de um time de futebol composto por pessoas em situação de vulnerabilidade social que treinam para competir no Torneio Social Mundial.
Cansado de ser o segundo em tudo, o jogador de futebol profissional Yoon Hong Sae (Park Seo Joon) agride um jornalista que o persegue. Logo, o caso ganha destaque na imprensa e ele tem a sua carreira ameaçada por não conseguir controlar a raiva. Em contrapartida, Hong Dae também tenta lidar com o fato de sua mãe ser uma foragida e estar devendo dinheiro para Deus e o mundo. Como uma forma de “aliviar a sua imagem”, a agência do jogador propõe que ele treine um time de futebol composto por pessoas em situação de vulnerabilidade social, enquanto a produtora So Min (IU), grava um documentário. Contra a sua vontade, o jogador cede às exigências de seu agente e acaba topando o desafio.
Dirigido por So Min, Hong Dae tem a função de escalar apenas os jogadores que têm uma história comovente para dar um tom de drama no documentário. Entre os escalados estão Son Bum Soon (Jung Seung Kill), um homem que foi morar na rua após sofrer um acidente em seu trabalho. Ele acaba se apaixonando por uma mulher com doença mental e a sua motivação de vida é ajudá-la a pagar um lugar para morar. Já Kim Im Su (Lee Hyun Woo), o atacante do time, sofre de “coração partido”. Além de ser órfão e viver vendendo revistas na rua, ele está à procura de alguém que desapareceu em um acidente.
Por último, o jogador Jun Hyo Bong (Ko Chang Seok) é talvez o personagem mais amoroso do filme. Após financiar um empréstimo para um amigo e o dinheiro nunca ter sido pago, por conta de sua inocência, sua esposa pede divórcio e vai morar em outro lugar com sua filha. O objetivo dele, então, é ter um lugar para morar onde possa levar a menina.
Essas e outras histórias tornam “Campeonato dos Sonhos” um filme emocionante, mas ao mesmo tempo muito divertido. Dirigido e escrito por Lee Byun Hun, o longa narra os desafios que o time enfrentou e ainda enfrenta no Torneio Social Mundial que ocorre na Hungria. Ademais, a produção não possui um personagem principal que carrega a trama porque, ao contrário de muitos filmes, em “Campeonato dos Sonhos” as histórias se conectam formando um quebra-cabeça e cada personagem é o protagonista de sua própria vida.
Lembra que eu disse no começo que nós não temos garantia de que amanhã vamos morar na rua? Pois então, essa é uma lição bastante valiosa no filme, porque todos os personagens tiveram seus motivos para acabar em uma situação de vulnerabilidade social, mesmo que nem todos ali sejam pessoas sem moradia.
“Campeonato dos Sonhos” segue uma linha engraçada e divertida para tratar de um assunto sério e, muitas vezes, marginalizado e esquecido pelas autoridades públicas. De acordo com o diretor em uma entrevista a SCMP, “Para fazer uma analogia, eu diria que os sem-teto neste filme são pessoas que foram meio que temporariamente expulsas das cercas da sociedade”.
O filme começou as suas gravações em 2020, mas foi interrompido durante a pandemia da covid-19. O campeonato final, realizado na Hungria, era para ter acontecido na Colômbia, no entanto, por conta das condições do vírus, a produção teve que mudar de estratégia. Além disso, o diretor Lee Byun Hun contou que as cenas finais, onde ocorre o Torneio Social Mundial, foram gravadas apenas com duas câmeras e que tudo foi gravado como eles ensaiaram na Coreia, dá para imaginar?
Inspirado em uma história real
No começo do longa, somos avisados que a trama é inspirada em uma história real e que fatos semelhantes são apenas coincidências. Pois bem, como boa jornalista, fui atrás dos fatos para contar um pouquinho como o filme se inspirou em uma história real.
Antes de mais nada é preciso que você saiba que o torneio disputado pelos jogadores no filme existe na vida real. Conhecido como “Homeless World Coup”, ou em tradução literal para “Copa do Mundo dos Sem-Teto”, acontece no mundo desde 2003 e conta com as seleções de diversos países. Assim como no “Campeonato dos Sonhos”, a Coreia do Sul ganhou destaque no campeonato de 2010 que aconteceu no Rio de Janeiro, aqui no Brasil. No entanto, no longa, o país que sediou a Copa é a Hungria, mas dois jogadores brasileiros são peça fundamental para criar a narrativa do time durante as disputas.
Ao contrário do final do filme, na vida real, a seleção coreana ganhou apenas 2 jogos e perdeu outras 10 disputas. No entanto, os coreanos acabaram levando para casa o prêmio de “Melhor Estreante” e, assim como no filme, a seleção teve apenas poucos meses para ser treinada. Ademais, existe um documentário que conta um pouco sobre a história da seleção e foi o que inspirou o diretor e escritor Lee Byun Hun a produzir o longa.
Por fim, outro ponto importante a ser destacado é a presença da revista Big Issue no filme. Em algumas cenas, é possível ver alguns jogadores vendendo o objeto nas ruas e metrô. A questão é que a revista existe na vida real com o nome The Big Issue Korea. Assim como o campeonato, a revista foi fundada com o propósito de ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade social a mudarem de vida. Em 2010, o item era vendido para as pessoas por 1.400 won e revendido ao público por 3.000 won.
Apesar do enredo um pouco lento, “Campeonato dos Sonhos” surpreende pela história cativante, o espírito esportivo e a atuação excelente dos atores. O longa é uma ótima opção para assistir num domingo à tarde sem muitas preocupações.
Ah, mas uma dica: assista com um lencinho para enxugar as lágrimas pois você vai se emocionar com o final. Os três anos de espera valeram a pena. O filme está disponível na plataforma Netflix, assista ao trailer abaixo!
Texto por Ana Carol | Revisão por Anniye | Equipe de Redação da K4US
www.k4us.com.br | Não retirar sem os devidos créditos