Difícil, mas importante, Miss Baek recria uma complicada história real, que investiga a violência infantil e as diferentes consequências na vida de suas vítimas.


Título: 미쓰백/Miss Baek

Ano de produção: 2018

Data de estreia (Coreia): 11/10/2018

Gênero: Drama

Duração: 97 minutos

Diretora: Lee JiWon

Elenco: Han Jimin, Kim SiA, Lee HeeJu, Kwon SoHyun

Média de avaliação no Viki: 9,6

Principais Prêmios: Melhor Atriz (Han Jimin) no Blue Dragon Film Awards, Korean Association of Film Critics Awards, KOFRA Film Awards e Women in Film Korea Festival. 

Sinopse: Após sofrer com uma mãe extremamente violenta, durante sua infância, Baek Sang-Ah cresce aprendendo a afastar todos de si. Atendendo por Miss Baek, um dia ela cruza caminhos com Jieun, uma menina que sofre violência doméstica nas mãos do pai, um viciado em jogos, e da namorada dele.

Miss Baek vê na menina um reflexo de si mesma, se abrindo para Jieun aos poucos, até que decide ajudá-la. Ainda que seja uma completa estranha na vida da menina e, por isso, não tenha direito de protegê-la, Miss Baek pretende fazê-lo de qualquer forma, mesmo que precise colocar em risco sua própria segurança e liberdade.

Personagens

Baek Sang-Ah: Interpretada por Han Jimin, Baek Sang-Ah — ou Miss Baek, como prefere ser chamada — é uma mulher que sofreu durante toda sua vida. Quando criança, era vítima de violência doméstica nas mãos da própria mãe e, anos depois, foi condenada por se defender de um abuso. A combinação resulta em uma personalidade extremamente fechada e, aparentemente, sem sentimentos afetuosos para quem quer que seja.

Kim Jieun: Kim Si-Ah vive uma jovem criança que mora na mesma vizinhança de Miss Baek. A garota cruza seu caminho algumas vezes, antes de Miss Baek decidir ajudá-la e compreender a situação em que ela vive. Morando com pai e madrasta igualmente violentos e relapsos, a menina vive presa — literalmente — dentro de um banheiro, e sofre com extrema agressão por parte do casal que lhe abriga.

Jangsub: Lee Heejoon dá vida a um detetive que acompanha de perto Sang-Ah, desde sua adolescência, quando teve de abaixar a cabeça para a corrupção da polícia e prender a jovem, após ela atacar um homem para se defender de um estupro. Desde então, ele tenta cuidar de Miss Baek, considerando até mesmo o casamento, como forma de se manter próximo da protagonista. 

Kim Ilgon: Interpretado por Baek Soojang, o pai de Jieun, sustenta dois vícios: jogos e álcool. Ambos funcionam como artifício, tanto para que ele ignore as agressões contra sua filha, praticadas por sua namorada, quanto para que ele mesmo seja violento com a criança. Também fruto de uma família rodeada de maus tratos, Soojang repete o ciclo de violência com Jieun. 

Joo Mikyeong: A comparação com madrastas más de contos de fadas nem cabe nesta personagem extremamente cruel, vivida pela atriz Kwon Sohyun. É ela quem mais tortura Jieun, psicológica e fisicamente. Enxerga a criança como mera fonte de renda e menos digna de bom tratamento do que seu próprio cachorro — que recebe um carinho surpreendente da dona, considerando que a mesma mulher tranca uma criança em um banheiro e a espanca diariamente. 

Opinião

Focado na vida de duas gerações de mulheres que sofrem com a violência doméstica e suas consequências, já é de se esperar que Miss Baek não seja um filme fácil. E nem deve ser. O roteiro é baseado em um caso real, e uma abordagem diferente poderia tanto banalizar quanto amenizar uma cruel realidade, que precisa ser exposta. 

Já de início, o longa desconstrói a narrativa convencional da figura feminina na sociedade sul-coreana, quando Miss Baek rejeita o que seria “o homem perfeito” — Jangsub —, declarando que não foi feita para ser esposa ou mãe. Durante boa parte do filme, concordamos sobre a questão romântica da protagonista, mas torcemos para que ela mude de ideia sobre se tornar uma figura materna. Isso porque, quando ela cruza caminho com Jieun, entendemos prontamente que a relação entre as duas estranhas é mais íntima e sensível do que qualquer relação familiar que ambas tiveram.

Por ter seu nome de nascença — Baek Sang-Ah — conhecido, graças a sua história de abuso durante a infância e adolescência, a protagonista adota a alcunha de Miss Baek e, mais tarde, entende que precisa adotar não apenas um novo nome, mas a jovem Jieun, para que sua história não se repita na vida da pequena. Porém, até que isso aconteça, já se passou metade do filme e, quem não tem muita paciência, pode se perder no ritmo que orienta Miss Baek a decidir por lutar com e ao lado de Jieun.

Muitas vezes, você parece estar vendo Sang-Ah em ambas as figuras femininas centrais do filme. É como se ela olhasse um espelho que refletisse o passado e, ao mesmo tempo em que deseja se ajudar, tem medo do que o contato com aquela realidade pode desencadear em seu psicológico. Por isso, o longo processo de decisão é completamente compreensível, se você se propor a entender o dilema da protagonista. Para quem nunca passou por uma situação de violência doméstica e infantil, não há dúvidas de que a opção mais correta é cuidar de uma criança que está enfrentando essa situação, sem qualquer amparo. Porém, para algumas pessoas, que já passaram por aquilo pelo o que a criança está enfrentando, ajudá-la pode significar reviver todo o sofrimento e dor, que se busca superar.

A questão da dor, tanto psicológica quanto física, é algo tratado de forma muito realista durante o filme — definitivamente contribuindo para que ele não seja uma experiência fácil. Antes de apertar o play, você deve saber que vai assistir cenas gráficas de violência cometida contra crianças. Mesmo que você desvie o olhar da tela, a cena continua rolando, assim como situações semelhantes continuam acontecendo na vida real. 

É o tipo de filme que te faz despertar e provoca revolta. Também é um filme violento, sobre violência, mas com pequenas delicadezas, principalmente quando se trata da relação que se desenvolve entre a menina e a mulher. As cenas que demonstram esse laço sensível entre as duas, inclusive, funcionam como um alívio à tensão que o filme todo carrega, e sobre a qual Miss Baek e Jieun vivem, enquanto fogem de seus fantasmas e agressores.

Com 1h38 de duração, o filme leva muito tempo no dilema de Miss Baek sobre ajudar ou não Jieun e, com isso, acaba deixando de aprofundar nas histórias dos personagens, que parecem ter todos suas complexidades. A demora no desenvolvimento aponta para uma densidade de Miss Baek, mas pouco se mostra sobre o que aconteceu em sua adolescência, ou como ela se aproximou de Jansgub. O pai de Jieun e sua namorada também provocam curiosidade, apesar do comportamento repulsivo que apresentam. Ele, porque também  passou por situação de violência durante a infância — o que nos faz questionar o quão normalizado isso pode ser na sociedade sul-coreana, ou no geral —, e ela, por maltratar a criança, mas ser amorosa com seu cachorro — o que, afinal, define uma vida sendo mais valorosa que a outra? 

Apesar da resposta não chegar — provavelmente porque essa questão não deveria nem ser levantada, em primeiro lugar —, o filme traz um final satisfatório não apenas para o espectador, mas para Miss Baek e Jieun. Não definiria como um final exatamente feliz, mas definitivamente é o encerramento de um ciclo de violência, que proporciona a chance de uma vida normal a uma criança que muito sofreu, e a oportunidade de recuperação a uma mulher que descobriu, tarde demais, o que é afeto e família. 

O filme só chegou a 671 cinemas e foi visto por apenas 723,1 mil pessoas, mas faz parte de um novo espaço ocupado pelo protagonismo feminino no cinema sul-coreano, algo que se expandiu em 2019, com títulos como “Kim JiYoung, nascida em 1982″, “A resistance”, e “Moonlit Winter”. Além do protagonismo nas telas, atrás das câmeras a presença feminina também é forte e de suma importância, contando com a estreia de Lee Jiwon como diretora. 

Apesar da pouca bilheteria ($ 5,2M), o filme alcançou aclamação crítica, levando para casa prêmios em todas as indicações na premiação da Associação de Críticos de Cinema da Coreia. A atuação no longa também rendeu a Han Jimin diversos prêmios pela Ásia, incluindo o de melhor atriz no Blue Dragon Film Awards. 

+ Assista Miss Baek no Viki +

“A realidade é que filmes feitos por mulheres e filmes com mensagens sociais enfrentam muitas dificuldades antes mesmo de serem exibidos nos cinemas. Eu realmente quero expandir a indústria cinematográfica, onde não há muitos filmes femininos” – Han Jimin sobre Miss Baek


Texto por Bea | Equipe de redação da K4US
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