A resposta é simples: Nenhuma.
Quem não reconhece o símbolo de coraçãozinho com os dedos, não é mesmo? Mas para contextualizar a pergunta inusitada e conceituar os dois termos “dramas”, “androginia”, precisamos relembrar o caso que viralizou nas redes no final de janeiro.
No dia 28 de janeiro, o pastor Ailton Junior, da Igreja Assembleia de Deus em Caruaru (PE), afirmou para uma multidão que o assistia durante o encerramento do 22º Congresso de Adolescentes que os fiéis não deveriam fazer o sinal de coraçãozinho com os dedos, que chamou de “coração de dorama”, por se tratar de uma manifestação à androginia.
“Não façam mais o coração de Dorama nos púlpitos da igreja para tirar fotos. Vocês sabem o que é dorama? Quem aqui sabe o que é Dorama? Defesa da androginia! Não há definição de macho, nem fêmea. E todo mundo fazendo o sinal de Dorama porque são ignorantes”, afirmou.
Pastor Ailton Junior
Como estava sendo transmitido ao vivo pelo canal do Youtube e muitos jovens e mulheres adultas presentes acompanham as produções asiáticas, a fala do pastor se tornou viral nas redes sociais. Inclusive, no vídeo é possível ver algumas expressões surpresas com a fala do pastor.
O vídeo original já conta com milhões de visualizações e rendeu críticas, defesas e memes sobre a fala polêmica do pastor. Mas afinal, o que significa as palavras “dorama” e “androginia” e o símbolo de coraçãozinho 🫰🫰?
Dorama
A palavra “dorama” em si já é difundida de forma errada no Brasil. Ela é muito usada para se referir a todas as produções asiáticas, em específico as séries coreanas que vêm fazendo sucesso na Netflix e em outros streamings. Porém, a origem da palavra “dorama” vem do Japão. Como os japoneses não conseguem pronunciar o encontro entre duas consoantes, eles acrescentam uma vogal, a letra “o”, de “drama” torna-se “dorama”.
Não é muito legal confundir os dois termos “dorama” e “drama” ou achar que é tudo a mesma coisa, pois há questões sociais e políticas envolvendo os dois países, Japão e Coreia do Sul, que devem ser respeitadas.
O certo é utilizar “dorama” para se referir às séries e telenovelas japonesas. Já para se referir às produções de outros países, utiliza-se a primeira letra do país, junto com a meia-risca e a palavra “drama”. Por exemplo, para as séries coreanas (k-drama), para as chinesas (c-drama), para as tailandesas (th-drama ou lakorn), para o taiwanês (t-drama) e por aí vai.
No entanto, o uso do termo “dorama” se polarizou e é difundido abarcando todas as produções asiáticas. Com o aumento deste tipo de produção nos streamings, diversos públicos passaram a acompanhar as séries, desde jovens adolescentes até adultos e idosos. Seus apreciadores são apelidados como “dorameiros” e realizam maratonas das séries com episódios entre 8 e 20, no geral, com uma trama central envolvente.
Um feito notável em 2023 foi a inclusão da palavra “dorama” no vocabulário da Academia Brasileira de Letras (ABL), o que levou a muitos elogios e também à críticas no meio linguístico justamente por já existir esse embate entre “dorama” ou “drama”.
A Nova Palavra é:
dorama s.m.
Obra audiovisual de ficção em formato de série, produzida no leste e sudeste da Ásia, de gêneros e temas diversos, em geral com elenco local e no idioma do país de origem.
Academia Brasileira de Letras
Vale destacar que muitas das séries possuem valores defendidos pela comunidade religiosa presente no congresso. Desde o casamento, amor e respeito, com um ritmo de enredo e conceito diferente de séries estadunidenses ou brasileiras, por exemplo, que possuem cenas mais explícitas de relações sexuais. Além de possuírem diversos gêneros, como romance, escolar, comédia, policial, drama médico, ficção científica, suspense, terror e outros.
Androginia
Uma pessoa andrógina apresenta, simultaneamente, características do gênero masculino e feminino, mas não deve ser confundido com o termo “hermafrodita” ou presumir sobre a orientação sexual de uma pessoa, seja ela heterossexual, gay, bissexual, lésbica ou outra, além das pessoas não-binárias.
A androginia mescla o feminino e o masculino, sendo muito presente na moda e na maquiagem como forma de expressão e atitude.
Durante as décadas de 1960 e 1980, bandas de rock e cantores como Led Zeppelin, David Bowie, Marilyn Manson, Prince, The Doors, Kiss e outros, utilizaram o visual andrógino para se expressar e críticar o conservadorismo da sociedade em suas roupas, performances e maquiagens. No cinema, Tilda Swinton também desafiou os estereótipos de gênero em sua aparência e escolhas de papel.
Atualmente, a androginia continua presente na música, nas passarelas, nos cinemas e no cotidiano dos jovens e adultos que se identificam com o estilo e comportamento. No gênero musical k-pop, a androginia é um elemento bem explorado, desde as roupas, acessórios, maquiagem e penteados, até em coreografias, letras e falas com o fandom. Nomes como G-Dragon do grupo BIGBANG, Taemin do SHINee e Jimin do BTS são alguns dos idols do k-pop que se expressam de maneira única, sem rótulos pré-definidos.
Coraçõezinhos para todo mundo
Com a repercussão no grupo de “dorameiras” que apenas cresce no Brasil, pudemos ver o alcance que as obras audiovisuais e seus fãs possuem. Associar o termo “dorama” à “androginia” demonstra uma falta de conhecimento e até uma tentativa de LGBTFobia ao tentar diminuir o público mencionado, que busca mais liberdade e autenticidade em sua forma de estar.
A união entre indicador e polegar nada mais é do que a representação do amor e carinho por algo ou alguém, sendo uma forma popular de formar um coração na Coreia do Sul. Polarizado graças a hallyu com grupos de k-pop e dramas asiáticos, o coraçãozinho pode ser visto em fotos de idols, atores de k-dramas e até em fotos na igreja, e claro, não há problema algum com isso.