Revelar-se para os pais como uma pessoa LGBTQIA+ nunca é uma tarefa fácil, inclusive para aqueles agraciados por pessoas que parecem aceitar nossa comunidade. Nunca é possível prever suas reações e o medo de se surpreender negativamente ou confirmar um receio antigo falam mais alto. O boys love (BL) tailandês “Lovely Writer”, no episódio 9, divulgado oficialmente no YouTube na última quarta-feira (28), exemplificou com maestria o quão doloroso pode ser simplesmente querer ser honesto consigo.
O nono episódio começa do ponto em que o anterior terminou. Acompanhamos a revelação do Aoey e não demora muito para que uma aguardada cena entre o casal protagonista aconteça – importante ressaltar como o roteiro consegue mesclar humor e delicadeza. Em nenhum momento temos dicas para onde o capítulo vai nos levar – a revelação aos pais de Gene e Nubsib –, mas quando chegamos no ponto desejado é possível perceber uma genialidade na forma em que tudo acontece. Há verdade nas cenas.
Em um resumo rápido, o espectador é levado até um jantar entre as famílias do casal e o clima se torna tenso aos poucos, sempre crescendo a cada fala dos personagens. Comentários sobre a popularidade dos BLs são feitos e as mães de Nubsib e Gene brincam com a possibilidade dos dois se casarem um dia. O pai de Gene é o único que realmente se mostra desconfortável, mesmo com os demais alertando que é tudo brincadeira.
O clima esquenta quando Gene revela aos pais que está namorando Nubsib e a mesa fica em completo silêncio. Importante frisar como a cena tenta ao máximo trazer uma certa realidade para o momento. As mães alegres brincando com a possibilidade de casarem os filhos se calam. É um jeito muito sutil do roteiro nos dizer que é muito fácil levantar a bandeira LGBTQIA+ quando ela não está hasteada dentro de sua própria casa.
Indo um pouco mais além, o silenciamento das mães talvez seja a forma encontrada de também criticar aquelas pessoas que consomem produtos LGBTQIA+ como se nós servíssimos apenas para mero entretenimento, um produto feito para ser apreciado como um objeto qualquer. Entretanto, quando precisamos de aliados, essas são as primeiras pessoas que soltam nossas mãos.
Precisamos de aliados? Com certeza, mas é em nós mesmos que devemos nos apoiar seja nos momentos mais urgentes e necessários, como até naqueles que parecem ser insignificantes. Precisamos sempre estar juntos, como uma fortaleza incapaz de ser derrubada. O momento em que Gene e Nubsib apenas dão as mãos, de forma tão delicada, exemplifica isso.
Jantar encerrado, cada um em sua casa. É nesse momento que Gene traz o questionamento mais importante, pelo menos para mim, de todo o enredo até o momento, ao seu pai. “Se eu não tivesse certeza, eu não teria contato para você e mamãe. Eu poderia continuar mentindo para vocês dois, mas não quero fazer isso. Estou sendo honesto comigo mesmo. Estou sendo honesto com todos. É isso que eu mereço, pai?”, questiona.
Gene não está questionando unicamente para o seu pai. Ele fala com a própria comunidade, que diariamente passa por isso, e de certa forma, comunica também com pessoas LGBTQIAfóbicas. Nós só queremos ser honestos conosco e com as pessoas ao nosso redor. Não merecemos sofrer unicamente por tentarmos ser verdadeiros. Revelar-se é um ato de coragem e não reconhecer isso exemplifica o quão perversa a homotransfobia pode ser.
Apesar de acertar em cheio ao abordar essas questões de forma bem profunda, o episódio se perde um pouco nos minutos finais. Toda a extensão da última cena, que serve para mostrar como a revelação de uma pessoa homossexual afeta todos a sua volta, soa como um exagero em termos de duração, fazendo com que a trama perca um pouco de peso por cansaço. É uma cena muito importante, mas o melodrama que ganha soa artificial.
De qualquer modo, o episódio ainda pega de surpresa ao começar de uma forma muito leve – já que a questão de Aoey se resolve rápido – e termina muito pesado e extremamente sério com o seu discurso. Não é fácil revelar-se como um membro da comunidade LGBTQIA+ e a dor que este ato pode trazer é inigualável. É uma realidade que, infelizmente, ainda atinge a maioria de nós.