Entre os três cenários abordados até então nessa série de textos sobre a representatividade homossexual na Coreia do Sul, o ambiente de hoje talvez seja o menos aberto e mais limitado. Levaremos em conta principalmente a música main stream coreana, ou seja, aquela que é de mais fácil acesso para o público em geral. Afinal, são esses grandes nomes da música que, quando tem a possibilidade de colocar assuntos delicados em pauta, podem criar um maior impacto social.

Para se atualizar, que tal ler a parte 1 e 2, caso ainda não tenha visto?

HOMOSSEXUALIDADE NA COREIA DO SUL: A REPRESENTAÇÃO NA MÍDIA PT.1

HOMOSSEXUALIDADE NA COREIA DO SUL: A REPRESENTAÇÃO NA MÍDIA PT.2

Acredito que grande parte dos K-Poppers já desejou que algum idol fosse realmente parte da comunidade lgbtq+ e se assumisse, afinal a importância de nos vermos representados é sempre enorme, e já até discutimos sobre isso em um outro texto da K4US, abordando o primeiro idol abertamente gay do K-Pop.

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Levando em conta o tanto de grupos que cada um de nós conhecemos, já pararam para pensar quantas pessoas homossexuais existem nessa indústria e não podem expressar sua orientação sexual? Quem, com uma potencial carreira dos sonhos em mãos, arriscaria tudo para se assumir diante de uma sociedade homofóbica? Existe um motivo para grande parte do público só conhecer um idol assumido, sendo ele pouco popular dentro de seu próprio país, e independentemente produzido. E para quem não conhece, além dele, temos também outro músico assumido. Apesar de participar de um cenário musical mais alternativo, Marshall Bang é um cantor coreano-americano que também representa a comunidade na indústria. Sob o stage name de MRSHLL, atualmente ele está sob o agenciamento da Feel Good Music, empresa de Yoon Mirae e Tiger JK.

Além do espectro homo, existem outras definições de orientação e identidade. Hansol, ex-integrante do Topp Dogg (atual Xeno-T) se assumiu assexual através de uma live no Instagram. E se para alguns sul-coreanos a homossexualidade não existe, imagine a ideia de não se sentir atraído sexualmente por nenhum gênero? Hansol foi, assim como os outros artistas assumidos, bastante corajoso em falar abertamente sobre sua orientação.

Em uma indústria composta por centenas de artistas, temos um total de TRÊS representantes assumidos na música pop. E todos homens, o que é bastante significativo.

 

MRSHLL, Hansol e Holland: músicos que são parte da comunidade lgbtq+

A música pode ser considerada o meio artístico sul-coreano menos aberto à representação homossexual, o que denuncia um alto nível de hipocrisia, considerando que uma das grandes estratégias para vender seus artistas é criar na mente do público a imagem de casais e relações homoafetivas.

A representatividade homossexual na música é mínima quando se trata de artistas assumidos. Mas, como já observamos em outros textos acerca do assunto, o audiovisual possui uma liberdade maior para contar histórias desse tipo. Muitos MVs trazem histórias de amor entre pessoas do mesmo gênero de forma muito sutil e velada, como a estratégia usada pela TV sul-coreana. Mas outros casos parecem não ter medo algum de mostrar essas histórias.

O MV mais conhecido e comentado que traz esse tipo de representatividade é, sem dúvida, “Please Don’t”, do solista K.Will. O motivo é o plot twist presente na história, já que ao longo do clipe somos guiados a acreditar em algo bem diferente do que realmente está se passando.

Um outro clipe que traz uma relação homossexual bem clara é o de “One More Day”, parceria entre as meninas do Sistar e o DJ Giorgio Moroder, onde as protagonistas acabam com um boy lixo que maltratava uma delas. Vitória das lésbicas (e bi) aqui!

O caso de “Touch”, da solista Anda, é um pouco diferente. Por ter uma pegada mais alternativa e independente, podemos ver que a artista tem uma liberdade muito maior para expor em seu MV cenas mais reais e até explícitas. O legal também é que, ao contrário dos outros clipes onde os artistas colocam atores para interpretar essas relações homossexuais, é a própria Anda que aparece entre as pernas de meninas ao longo do MV.

Inicialmente nessa série de textos íamos abordar a representatividade lgbtq+, mas como já a representatividade homossexual é pouca, imagine as outras cores da bandeira. De toda forma, com a música pudemos trazer um MV que traz a história de uma mulher trans. A música é “Love is a Dog from Hell”, do Mad Clown. Levando em conta que se trata de uma cena rap bastante machista, como a da Coreia, é bem ousado da parte dele assumir esse tipo de história em uma música sua. A solista Suran é feat nesta música, e ela também tem um clipe com história de representatividade.

Um exemplo que sempre gosto de lembrar é o da música Party (XXO) do girl group GLAM, que na própria letra da música fala que não importa se você é homem ou mulher, o que importa é paixão (uma curiosidade é que o RM do BTS participou da composição dessa música). Infelizmente o grupo acabou, mas deixou a mensagem.

E para fechar trazemos aqui um péssimo exemplo. Assim que vi a miniatura do vídeo eu cliquei já feliz em descobrir um novo MV que trazia relação entre mulheres e eu não conhecia… Uma decepção. Completamente ao contrário da sensibilidade presente no MV do Mad Clown, também rapper, o tal Sweet Boy trouxe um clipe carregado de sexualização da figura feminina. As duas atrizes aparecem o tempo inteiro com pouca roupa, tendo especificamente seus corpos filmados e em determinado momento  apenas a bunda delas é focalizada, criando uma espécie de paralelas, onde o tal cara é o ponto central. Podre, mores, alerta de boy lixo aqui.

Estes são apenas alguns exemplos do volume que a representatividade homossexual acumula na indústria da música coreana. Obviamente alguns ficaram de fora da lista, como Because of you, do After School; e She’s a flirt, da Baby Soul e Yoo Jia; mas logo adianto: não vai muito além disso.

No momento a esperança maior está depositada no cantor Holland e sua coragem de ser um dos poucos artistas sul-coreanos assumidos, mas alguns outros artistas já afirmaram também abertamente seu apoio à comunidade. Yoohyeon, do Dreamcatcher, durante a passagem pelo Brasil, respondeu à uma fã sobre apoiar a causa; Namjoon do BTS já twitou sobre gostar ainda mais da letra de uma música após descobrir que se tratava de uma música sobre homossexualidade; Jonghyun do SHINee também veio à público, através do twitter, para declarar seu apoio à uma estudante que sofria por sua orientação e identidade. Chaeyoung do Twice também já falou publicamente sobre o assunto, comentando sobre o filme “Carol” e sobre como as pessoas julgam, sem considerar que amor é amor independente dos gêneros envolvidos. Jokwon e Heechul, ídolos que frequentemente tem sua orientação sexual questionada, também já afirmaram que não veem problema algum na homossexualidade.

De longe, a música, e especialmente o K-Pop, é o meio cultural e midiático coreano que mais precisa de avanços com relação a representatividade homossexual. Sabemos que se dependesse dos fandoms, boa parte dos idols que precisam esconder sua orientação sexual seriam bem acolhidos, mas infelizmente a pressão e o medo que a sociedade sul-coreana (e mundial) projeta ainda faz refém muitas mentes e corações que sonham com a liberdade.

 

Texto por BEA @ Equipe de redação da K4US
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